31 de agosto de 2023

Depoentes poderão ficar calados na CPMI? Entenda o direito ao silêncio

Autor: Cecília Marinho

As Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) e as Comissões Parlamentares Mista de Inquérito (CPMI) têm poderes de investigação idênticos aos conferidos às autoridades judiciais.

Isso garante aos depoentes que comparecerem no Legislativo as garantias iguais se estivessem sob a presença de uma autoridade policial ou um juiz.

Permanecer calado, é um desses direitos previstos no artigo 5º, inciso 63, da Constituição Federal. O direito ao silêncio para não produzir provas contra si também consta no artigo 186 do CPP (Código de Processo Penal). Sendo que, durante a chamada fase de qualificação, o depoente não pode recorrer ao direito de ficar calado.

Essa fase é quando o mesmo deve se apresentar aos parlamentares (ou em casos judiciais), dizendo seu nome, e seus dados pessoais.

Parágrafo único do artigo 186 da Constituição diz que “o silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa”.

Testemunha e investigado

O ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) Fábio Augusto Vieira usou do habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para ficar em silêncio durante depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) na última terça-feira (29).

O texto garantiu ao depoente o direito ao silêncio e o direito de não ser submetido ao compromisso de dizer a verdade. Nos depoimentos anteriores da CPMI, o convocado só não precisava responder a perguntas que o incriminasse.

Isso porque, há uma diferença entre a pessoa que se apresenta como testemunha ou investigado. É o que explica o advogado e pesquisador em direito constitucional, Lucas Sousa Gomes.

Em caso de testemunha, esta está comprometida com a veracidade dos fatos, ao contrário do investigado, que não está coberto sob a obrigação com a realidade.

“É preciso deixar claro o papel de cada indivíduo dentro de um processo judicial ou em eventual atendimento de requisição por parte de alguma CPMI. Entretanto, as testemunhas prestam um compromisso com a verdade, com o dever de responder de forma clara e objetiva as perguntas e questionamentos para que os fatos sejam esclarecidos. É possível encontrar decisões judiciais que visam resguardar o direito ao silêncio por parte da testemunha quando a pergunta causa prejuízo a si”, afirma o constitucionalista.

Limite para silêncio

A CPMI do 8 de janeiro chegou a acionar a Justiça do Distrito Federal contra o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), por ficar em silêncio durante seu depoimento em julho de 2023.

Em nota, o deputado e presidente da CPI do 8 de Janeiro, Arthur Maia (União Brasil-BA), disse que Cid “abusou ostensivamente” do direito ao silêncio. A Comissão alega que ficou configurado no caso o crime de impedir ou tentar impedir o regular funcionamento de CPI.

A lei que trata do funcionamento de CPI prevê pena de 2 a 4 anos de prisão para quem fizer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha à comissão. O advogado diz que Mauro Cid foi convocado na condição de testemunha, não de investigado.

Segundo Gomes, a discussão nesse momento é justamente a interpretação que deve prevalecer a respeito da decisão da ministra Cármen Lúcia. “Do ponto de vista jurídico e regimental, ele tinha o dever de responder os questionamentos, com exceção de eventuais perguntas que pudessem prejudicá-lo. Entretanto, resguardado por decisão da Suprema Corte, Mauro Cid optou pelo direito ao silêncio. Todas as perguntas que foram feitas prejudicavam Mauro Cid? Qual a amplitude da decisão da Ministra? São esses elementos que a CPI gostaria de esclarecer”, afirma.

Direito de silêncio parcial

O depoente também goza do direito de responder apenas às perguntas de seu interesse, ou da defesa. Isso significa, que o convidado das CPIs ou CPMIs faz jus ao direito do silêncio seletivo.

Exemplo desta manobra que a defesa do depoente pode usar, é o caso do hacker Walter Delgatti que permaneceu em silêncio ao ser questionado pela oposição durante a CPMI do 8 de Janeiro, na quinta-feira (17).

Delgatti decidiu utilizar o direito ao silêncio, concedido pelo Supremo STF, durante a segunda etapa de seu depoimento, no início da tarde, a partir dos questionamentos feitos pelos senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Marcos Rogério (PR-RO) e pelo deputado Delegado Ramagem (PL-RJ).

O advogado Sousa Gomes reitera que a CPI conclui explicando que as Comissões não podem depender apenas do discurso dos depoentes que são convocados. De forma que, os parlamentares têm o direito de utilizar outras manobras que ajude, na investigação.

“A CPMI não pode amparar todo o seu trabalho e desenvolvimento apenas no depoimento dos convocados. Vale ressaltar que ela dispõe de outros métodos para esclarecer os fatos. Por exemplo, conforme jurisprudência pacífica, a CPMI pode solicitar documentos de outros órgãos. Essas requisições documentais têm sido bastante utilizadas na atual CPMI dos atos antidemocráticos e também foi muito utilizada na CPMI da Pandemia”, conclui.

Fonte: CNN Brasil 

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