20 de março de 2025

Como Styvenson dribla o ministério da saúde e prejudica o RN para "construir" os hospitais que diz executar

Autor: Daniel Menezes

O senador Styvenson Valentim (PSDB) tem dito aos quatro cantos que constrói hospitais com suas emendas parlamentares. De fato, é possível usar recursos federais ou de emendas para construir hospitais, mas para construir um hospital, não basta vontade - é preciso saber se há necessidade na região e se haverá, depois dele pronto, capacidade de financiamento de suas nada baratas atividades. Erguer um equipamento desta natureza requer bastante planejamento com o município, estado, união e seu impacto no sus. 

Daí tiramos a diferença do nível de complexidade de fazer uma estrada, uma praça ou outra obra com uma emenda e produzir um hospital de saúde. Neste sentido, os parlamentares do RN, ao contrário de Styvenson, têm canalizado suas emendas para custeio de ações de saúde ou compra de equipamentos que pelo nível menor complexidade os recursos chegam mais rápido ao beneficiário.

Como o neosenador tucano consegue

Styvenson Valentim tem dito que fez hospitais em parceria e administração da Liga Contra o Câncer, uma entidade privada sem fins lucrativos. Mas como ele faz? Qual é o percurso?

Styvenson construiu um “acordo” com a Liga para driblar os órgãos de controle e, com isto, "construir" hospitais que passarão a ser posteriormente de propriedade da entidade privada que atende clientes privados e pelo Sistema Único de Saúde.

A triangulação: Ministério>município>entidade

Na verdade, ele repassa os recursos via emenda do fundo nacional de saúde ao fundo municipal de saúde da cidade onde a entidade tem operação, com objetivo de custear atendimentos médicos, cirurgias e atividade hospitalar. Posteriormente, passa a solicitar que o município não gaste o dinheiro com demandas de saúde do ente e repasse via pactuação os recursos a entidade de sua preferência. A Liga presta serviços privados também para o SUS, estando habilitada a receber recursos públicos.

Como as emendas de Styvenson não estão indo de fato para a construção, elas custeiam as despesas de manutenção da liga e é dessa forma que a liga, tendo agora uma sobra artificial de recursos, que ela pega esse dinheiro e faz o hospital. Foi assim na região do Seridó e está sendo assim em vários locais.

A própria liga não nega. Em seu relatório anual de 2023, explicita como o centro de diagnóstico de Seridó foi viabilizado pela citada operação:

a) Centro de Diagnóstico e e Ensino do Seridó (CDES): Execução da obra e aquisição de equipamentos e materiais diversos A obra foi iniciada em 19 de janeiro de 2023, e deverá ser concluída em julho de 2024, e está sendo viabilizada com recursos oriundos da economia gerada com o pagamento de despesas de custeio da LIGA, referente a duas emendas de Bancada de Incremento Teto MAC, indicadas pelo Senador Styvenson Valentim, em 2022 e 2023. Valor total: R$ 29.143.396,00.

No mesmo relatório há o envio de verbas para a liga por poderes públicos - assembleia, governo federal, governo do RN -, mas pelo intrumento jurídico adequado para tal finalidade, seja para a aquisição de equipamentos e pequenas obras. 

Em matéria veiculada pelo Agora RN no dia 27 de Maio de 2024, fica claro que o envio também se deu para o hospital que está sendo construído em Natal e que Styvenson diz que é obra dele. Parte dos recursos veio de emenda do senador, conforme trecho a seguir: "O projeto do hospital também conta com destinação de recursos para a Liga através de emenda individual do senador Styvenson Valentim no ano de 2023, que possibilitou que a instituição pudesse investir na obra".

Você, caro leitor, pode achar que temos aí um simples drible numa burocracia burra, mas a questão é bastante distinta. Vamos por partes para sumarizar bem o assunto:

Primeiro e já observado - trata-se de um arrodeio no planejamento do governo federal, que é avisado que a emenda vai para custeio. Com isto, o governo federal passa a se planejar como se aquela verba tivesse vindo para o RN para atender as prioridades em saúde de um determinado ente, dessa forma, ele consome o limite (teto Mac) de recursos que poderiam chegar aqui para essas atividades para atender os potiguares. Quem precisa de serviço de saúde é prejudicado;

Segundo - Styvenson e a Liga comprometem o TetoMac da instituição e, na prática, ela não pode mais receber recursos via SUS. Efetivamente, a operação está diminuindo a sua possibilidade de atender a população, deixando outros cidadãos carentes que poderiam estar sendo atendidos sem cuidado, para fazer caixa e construir o hospital;

Terceiro - depois de pronto, o hospital passa a ser da Liga e não do poder público, quer seja ele municipal, estadual e federal. Assim, Styvenson Valentim pode sair dizendo que fez um hospital, inclusive fazendo promoção pessoal com consequências políticas e eleitorais a respeito de uma ação que ele não produziu e não está assim oficialmente registrada (veja a imagem do texto), e a Liga termina com a posse do equipamento.

 

*PORTARIA GM do Ministério da Saúde Nº 3.283, DE 7 DE MARÇO DE 2024

Art. 12. Para a transferência dos recursos de que trata este Capítulo, o gestor do fundo de saúde do Estado, do Distrito Federal ou do Município acessará o InvestSUS Gestão, disponível no portalfns.gov.br, e selecionará como objeto o custeio da Média e alta complexidade, informando o número do CNES:

 

Art. 13. Os recursos do incremento temporário das Emendas MAC serão destinados à:

 

II - contratualização para atingimento de metas qualitativas e quantitativas, de unidades de propriedade ou gerenciadas por entidades privadas sem fins lucrativos contratadas, conveniadas ou com instrumento congênere firmado com o ente beneficiado.

 

§ 3º Para a transferência dos recursos previstos no inciso II do caput, o gestor local do SUS deverá observar a necessidade de contrato, convênio ou instrumento congênere com o ente federativo, nos termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, cujo valor englobe a totalidade dos recursos a serem repassados para o desenvolvimento de ações e serviços relativos à atenção de média e alta complexidade para cumprimento de metas.

 

Art. 14. Os contratos, convênios ou instrumentos congêneres, ou os aditivos aos instrumentos já existentes, deverão considerar o caráter temporário dos recursos financeiros a serem transferidos, para o estabelecimento de compromissos e metas que não ocasionem ampliação permanente dos recursos repassados à entidade privada sem fins lucrativos contratada.

§ 1º As metas quantitativas poderão englobar, dentre outros, o excedente de produção previamente autorizado e o atendimento a necessidades pontuais como a redução da fila da regulação, devendo estar de acordo com o plano de saúde e com a programação anual de saúde.

§ 2º As metas qualitativas poderão considerar, dentre outros, o aperfeiçoamento de práticas e condições de funcionamento das unidades, como implantação de protocolos, adoção de políticas de humanização e de adequação da ambiência e o tempo médio de realização de procedimentos.

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